Um dos hábitos financeiros mais tradicionais entre os brasileiros é a caderneta de poupança. Por gerações, o costume, que data de 161 anos, tem sido praticado por sua facilidade de gestão.
“Planejar e poupar são atitudes fundamentais para uma vida financeira organizada e tranquila, para que se tenha condições de realizar sonhos e colocar em prática diversos tipos de projetos”, diz Luiz Antonio Barbagallo, economista da ABAC – Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios.
A retenção e aplicação de parte dos rendimentos pode se dar por meio de vários produtos como o consórcio para investimentos em bens econômicos e a poupança para a remuneração por juros.
“Preferida por muitos pela segurança e simplicidade, e rejeitada por outros, muitas vezes por não oferecer rentabilidade satisfatória, a caderneta de poupança, há muito, caiu no gosto de grande parcela dos brasileiros e já faz parte da sua cultura financeira”, conceitua Paulo Roberto Rossi, presidente executivo da ABAC.
O consumidor poupa para a realização de objetivos, tais como a compra de um imóvel ou uma viagem de férias, e também para formar aquela reserva de emergências como desemprego ou problemas de saúde.
Em setembro, o sistema de consórcios, que também faz parte da cultura financeira do brasileiro, está completando seis décadas. “Comparado à poupança, ele não é visto como forma de economizar visando suprir eventuais dificuldades”, explica Barbagallo, “Ele se assemelha quando o foco é poupar para a aquisição de bens ou contratação de serviços que propiciem a efetiva realização de sonhos e projetos”, completa.
Ambos, poupança e consórcio, estão sujeitos a situações conjunturais da economia, que provocam reações e decisões de investidores e consumidores. Ao longo do tempo, identificam-se algumas semelhanças nos movimentos de aplicações em caderneta de poupança e nas adesões ao Sistema de Consórcios.
A análise do saldo entre depósitos e retiradas, chamados de captação líquida da caderneta de poupança, confirma, a partir do ano de 2006, a reação dos aplicadores face aos cenários econômicos de cada período.
“Em 2013, o Copom elevou a taxa básica de juros. A poupança, que a partir do ano anterior estava atrelada à taxa Selic, teve rendimentos competitivos em relação aos investimentos em renda fixa, o que provocou recorde de captações”, exemplifica o economista.
“A captação líquida ficou em R$ 71,05 bilhões, 43% maior do que o ano anterior e o triplo da média calculada entre os anos de 2006 a 2012, ou seja, foi uma resposta às medidas adotadas face ao momento da economia naquela ocasião”, complementa.
Alguns anos depois, de 2014 a 2016, houve grandes retiradas, utilizadas principalmente para pagamento de dívidas. Por se tratar de um quadro de recessão, com queda de renda e desemprego, as captações líquidas apresentaram saldos negativos de R$ 53,57 bilhões, em 2015, e de R$ 40,70 bilhões, em 2016.
Outra demonstração de influência ocorreu em 2020, com as turbulências do mercado geradas pela pandemia da Covid 19: os investidores migraram boa parte de suas aplicações para a poupança em busca de segurança, apesar de rendimento menor.
Naquele ano a captação líquida bateu recorde, ao alcançar a marca de R$ 166,31 bilhões. No ano seguinte, com o arrefecimento da pandemia, as retiradas voltaram a ser maiores do que as aplicações, gerando uma captação negativa líquida de R$ 35,50 bilhões.
Por outro lado, apesar de manter crescimento constante e bater sucessivos recordes de participantes ativos, os números do sistema de consórcios também sofrem algumas variações em razão das questões conjunturais que afetam os consumidores e investidores.
Na crise internacional de 2008, cujos reflexos atingiram todos os países, “o consórcio foi beneficiado, mostrando que em períodos de turbulência os consumidores enxergam no sistema um excelente mecanismo para a realização de seus projetos com segurança e planejamento”, esclarece Barbagallo.
De 2011 a 2014, o movimento de crescimento de participantes ativos mostrou ascensão, “semelhante à curva da poupança, exceto em 2014, quando os consorciados ativos deram um salto de 23,3% em relação ao ano anterior. Já a poupança anotou uma captação líquida de R$ 24,03 bilhões, bem abaixo do recorde de R$ 71,05 bilhões, verificado em 2013”, conclui.
Em 2020, no auge da pandemia, “os consumidores e investidores enxergaram no consórcio um porto seguro para aportar seus recursos”, lembra o economista, “com o Sistema batendo seguidos recordes de adesão. Ao responder à pesquisa encomendada pela ABAC junto à Kantar, Divisão de Pesquisa de Mercado, Insights e Consultoria da WPP, os consumidores citaram: “não era o momento de gastar grandes quantias”, ou, “enxerguei no consórcio uma forma de poupar, visto o baixo rendimento das aplicações naquele período”. Todavia, nos anos seguintes, houve movimentos diversos da poupança, com avanços em 2021 e em 2022 também”, confirma.
“É preciso deixar claro que poupança e consórcio, apesar das semelhanças nas oscilações ao longo dos anos, são produtos diferentes”, diz Rossi. “A poupança é uma aplicação financeira e remunerada por juros. Já o consórcio é a união de pessoas em torno de um objetivo comum, como a aquisição de bens para investimentos econômicos como, por exemplo, imóveis, que podem oferecer rendimentos de aluguéis no futuro, e em veículos e equipamentos, utilizados nos mais diversos tipos de negócios. Ou ainda, simplesmente para a compra de bens e contratação de serviços para uso sem objetivo de obtenção de renda”, compara.
Apesar do conhecimento sobre a importância de se ter reservas aplicadas, é relevante notar que a liquidez imediata da conta poupança é uma porta fácil para desvios de objetivos, inicialmente traçados. “A precipitação faz com que não se pense duas vezes em sacar e utilizar os recursos poupados para outros fins”, alerta Barbagallo.
No consórcio, a impulsividade fica contida em virtude das regras estabelecidas. “Nele, o objetivo é, a partir do planejamento das finanças pessoais, disponibilizar o crédito necessário para cada um dos cotistas do grupo, contando com a disciplina e a responsabilidade de todos”, contrapõe.